Livro: A Criatura de Andrew Pyper

30 junho 2020 Falando de Livros

A história de A Criatura, livro mais recente de Andrew Pyper, se inicia quando a doutora Dominick, uma psiquiatra forense, precisa avaliar a sanidade de um criminoso. Mas há algo diferente nesse homem, algo misterioso, beirando o sobrenatural. Esse criminoso parece estar conectado com um incidente na infância da doutora. Um caso mal resolvido envolvendo a morte de sua mãe.

Feridas antigas são reabertas…

Essa é a premissa do mais novo triller de Andrew Pyper. Uma trama promissora logo de cara, mas nada além disso. Infelizmente o livro fica muito mais no que poderia ter sido. Um esbouço.

Logo de cara o livro da a entender que algo sobrenatural ocorre. A personagem se lança ao mundo atrás de pistas para a resolução de seu passado e descobrir mais sobre tal homem misterioso. Tudo isso seria interessante caso não houvesse dois grandes pontos fracos: a protagonista e o antagonista.

Capa do livro A Criatura de Andrew Pyper

Vamos começar pela protagonista. A personagem Lily reúne todos os estereótipos possíveis que uma mulher teria na visão de um roteirista de filmes de ação dos anos oitenta. Ela não consegue tomar nenhuma decisão na história por conta própria. Está sempre sendo manipulada por um homem. Sempre tem, e é exaustivo, uma figura masculina dando as coordenadas de um próximo passo. Em vários momentos personagens falam algo que afeta o seu psicológico, o que é até contraditório em se tratando de uma psiquiatra forense. Uma personagem insegura. Não passa de uma tentativa de construção de uma Clarice Starling, porém sem todas as suas qualidades.

Uma personagem fraca, rasa e extremamente sexualizada.

Isso é um problema bem sério. Quando se vai construir uma personagem feminina é necessário um cuidado extra para não cair nas armadilhas do estereótipo. Uma personagem estereotipada é sem graça, rasa, e é esse o caso de Lily. Parece ser uma personagem criada por um adolescente de dezesseis anos de idade fã dos filmes da Emmanuele no espaço. Isso tira o poder de imersão de uma boa história e acaba com a experiência, com o prazer, da leitura.

Lily não faz absolutamente nada. Seus atos não contribuem para o andamento da história. Parece ser apenas um adereço de uma história carente de grandes momentos.

O antagonista, a poderosa criatura lendária, carece do mesmo problema. A narrativa anda, dá várias voltas de modo a justificar um background para ele. Uma construção de algo que era para ser épico, no mínimo decente, para o fechamento do terceiro ato. Lily anda praticamente pelo mundo inteiro amarrando as pontas e construindo a entrada triunfal do antagonista. A narrativa faz questão de mostrar o quanto a Criatura influenciou na criação dos autores clássicos como Mary Shelley, Bram Stoker e Stevenson.

Andrew Pyper foi realmente muito audacioso ao colocar o Frankstein, Drácula e o Senhor Hyde como apêndices de sua própria criatura. Ideia interessante, porém não funcionou. Todo um preparativo foi elaborado para o apogeu da criatura ao final do livro. Um fechamento com chave de ouro que não ocorreu. O que ficou foi um sabor frustrante, principalmente no que se refere ao confronto final. Anticlímax total. Fiquei muito triste com isso. Era um final decente o que me fez ter coragem de ler o livro inteiro,

A Criatura fez, prometeu, mas não entregou. Parecia mais uma paródia de si mesma.

Soma-se tudo isso a algumas pontas soltas que não foram amarradas, ou quando foram, não foram de modo satisfatório. Como por exemplo, personagens que sem motivação nenhuma aprecem e saem de cena sem fazer qualquer diferença. Contribuindo somente para um prolongamento desnecessário da dor de acompanhar a trama.

A impressão que tenho é que o livro foi escrito na pressa. O autor tentou repetir a fórmula de seus antigos sucessos sem êxito. O livro parece muito mais um esbouço de uma boa ideia. O auto preço cobrado também não ajuda o livro. A única coisa que A Criatura me fez foi ter vontade de ler os dois livros anteriores (O demonologista e os Condenados) que saíram pela Darkside que, justiça seja feita, manteve o padrão de alta qualidade mais uma vez nessa edição.

Uma pena. Queria muito ter gostado do livro, mas não foi dessa vez…

Ficha Técnica:

  • Capa dura: 304 páginas
  • Autor: Andrew Pyper
  • Editora: Darkside; Edição: Nova edição (3 de fevereiro de 2020)
  • Idioma: Português